A cidade de Russas necessita de um ABRIGO PÚBLICO PARA ANIMAIS ABANDONADOS, com clínica e profissionais adequados aos cuidados. Apoie essa ideia e exija dos nossos representantes políticos ações efetivas! A cada ano, dezenas de animais nascem e morrem, sem que haja uma política pública adequada que os proteja. Não podemos deixar que isso continue!

sábado, 14 de maio de 2016

ROSÁRIO

Uma pessoa, seu trânsito:
conter o infinito no finito.




Sou uma pessoa de carne e osso,
e o tempo me atravessa.
Eu, ínfimo-um, percorro
a história que me faço,
aparentemente só.

Moro na presença que
me desfruta a fala, o olhar,
as manhãs que, por lembrança,
ainda são, mas que já se foram.

Sofro impasses e risos.
É de lei que assim o seja:
oscilar entre oblíquos
e saúdes; suportar
a asa que sustém
o peso de toda a alma
que carrego.

Sou de um tempo desistorizado,
tempo em que os homens já não andam
desarmados de argumentos e cobranças.

Quando meigo e reclinado no leito de um céu,
desejo o sweet-kitsch da canção que,
entre rosas vermelhas e domadas,
derrama coelhos num dia de abril.

Quando crasso, mergulho cavalos
em ruivos prados; vou-me
para o lado de dentro do véu,
onde a palavra ainda é virgem.

E desconfio de que o amanhã
revelará apenas a novidade já sabida,
a de que o mundo não mudou
e isso aconteceu enquanto eu partia
de um dia para o outro,
como num rosário.


│Autor: Webston Moura
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sexta-feira, 13 de maio de 2016

O ABANDONO


(Onde o incerto, também a vida)


A calidez com que o dia se ergue
e afia o seu humor por sobre as casas.
A nossa forma mesma de recebê-lo,
impossibilitados de sermos mais.
A vaga lembrança, no meio da tarde,
de um momento de devaneio.
A consciência e os hiatos
que preencherão o corpo.
O inventário de infrações e desejos,
caderno posto a funcionar sem fim.
A pele que se enruga, ao espelho:
luz devolvida em desagrado.

Abrir a porta,
como quem já sabe,
e, a seu pé,
um perene tigre reencontrado.
Erguer os braços e despejar
os restos de um sono conhecido.

Bocejar
(um por um triz):
e ar não faz música.

Tomar banho,
comer o rápido
e sair em áspero.

O abandono.


│Autor: Webston Moura
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segunda-feira, 9 de maio de 2016

NAS NUVENS DO PEITO

No fim da tarde, o vento e a amizade.




O homem de pouca conversa,
com uma gaiola sem canário
e uma coleção de gravatas borboleta.

Comprava o jornal, tomava o café,
fumava, punha-se a olhar a cidade,
passeava praças e ruas.

Sabia dos terminais de ônibus
e do preço dos legumes.

Era de pouca conversa
e, assim, não lhe apetecia
dar-se ao saber alheio mais que
o exposto em sua figura.
O mais era a imaginação dos outros.

Comer, dormir,
banhar-se, vestir-se,
tomar sabência
da pressão arterial
e do fígado,
ver subir e descer
governos,
pagar impostos
e taxas.

Abria,
entrava
e fechava
aquela porta.
Sua casa,
aquela das janelas que só
às vezes eram abertas:
nada se via de mais.

(Nas nuvens do peito,
ao som do Hyperborea,
Teresa dançava enamorada
de Vinícius de Moraes
─ e ninguém sabia).


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NOTA:
1. Hyperborea refere-se a um dos álbuns da banda alemã Tangerine Dream.

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│Autor: Webston Moura
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quinta-feira, 5 de maio de 2016

A MOEDA SEM FACES

Pagarei na mesma moeda!
Anos depois, ainda estava lá.

Numa velha caixa de sapatos,
a servir de pequeno arquivo,
o envelope delicadamente cuidado
(é meu costume),
sem dobras,
delgado e já não tão branco,
o selo datado
de alguma íntima paragem
a que me reservo não dizer.

Dentro,
de entre três tipos de papeis,
cores distintas, tessituras não menos,
o cheiro, embora velho, ainda.
E, também, todas a palavras,
frases ditas em en-ca-de-a-men-to
perfeito ─ poder-se-ia dizer uma música
ou a forma com que as geometrias do regular
se expõem ao sol dos nossos olhos ─,
tudo que num setembro ido
havido me foi
quando li:
pagarei na mesma moeda!

Distinguiria, se soubesse
a peleja, se assim o fosse
(que teria sido?),
mas não sei até hoje
mais que o depois,
o que me ficou:
o nunca mais.

Agora, que faço eu da vida sem você?[1]



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NOTA:
1. Primeiro verso do refrão da canção popular "Você não me ensinou a te esquecer" de Fernando Mendes (seu intérprete primeiro), a qual Caetano Veloso depois "refez" à sua maneira.

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│Autor: Webston Moura
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sexta-feira, 29 de abril de 2016

O ELO-ENCONTRADO

Não fará com que te solte
Nada no mundo: me prende
Que assim vence não se rende
Nosso amor. Nós: és-me. Sou-te




Procuras-me? À procura estou dAquela
Mulher-Síntese, a Múltipla (Cavala
Lâmia Circe Vampira Generala
Mãe Amiga Irmã Noiva Cinderela

Fêmea Amada) e Si-Mesma: desabala
Meu ser e desintegra-se, esfacela-
Se, entrega-se à Visão de Ti, a Bela
Ante a qual já não sou: sou-Te; és-me; estala

O novo sermos em fusão; anulo
O outro que fui, refaço-me Teu; Ela,
A que foste, em mim transmudas; engulo-

Te, entranhas-me e anelados, em casulo,
Elo, circumprojeto-Te; enovelas-
Me, engravidas-me, ao passo que Te ovulo



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# Poema constante de "Miravilha: Liriai o campo dos olhos" (Confraria do Vento, 2015)

│Autor: Alves de Aquino, O Poeta de Meia-Tigela


# LEIA TAMBÉM:



O Poeta de Meia-Tigela (Alves de Aquino), natural de Fortaleza-CE, 1974, participou em 2007, da Antologia Massanova – Poesia Contemporânea Brasileira. É autor de: Memorial Bárbara de Alencar & Outros Poemas (2008); Concerto Nº 1nico em Mim Maior Para Palavra e Orquestra. Poema: Combinação de Realidades Puramente Imaginárias [Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2010]; Miravilha – Liriai O Campo dos Olhos [Confraria do Vento, 2015]. Seu blog: http://opoetademeiatigela.blogspot.com.br/.

quinta-feira, 28 de abril de 2016

Hálito de terra

Com as mãos infantis,
desequilibrou minhas
águas primitivas:

meu peixe de infinita candura.

Em seu lago
de salgado gosto,
renova oceanos quando chora
e planta benquerenças nas bordas
de meu rio.

Porque livre está de minhas areias,
embora semente,
               fruto
               e raiz.


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# Poema constante de "Milagreira" (Casarão de Poesia, 2011)

│Autora: Iara Maria Carvalho



Iara Maria Carvalho nasceu em 1980, em Currais Novos, Seridó norte-rio-grandense. É graduada em Letras e mestra em Estudos da Linguagem, pela UFRN. Atua como agente cultural em sua cidade, através do Grupo Casarão de Poesia. Como poeta, venceu o 3º Concurso de Poesia Zila Mamede (Parnamirim/RN, 2006) e obteve a 3ª colocação no Concurso Nacional de Poesia Helena Kolody (Curitiba/PR, 2010), dentre outros concursos.

quarta-feira, 27 de abril de 2016

LÁGRIMAS ROLANTES

I can’t goethe no




Tardinha passando
Crianças brincando
Vejo-as sorrir
Mas não para mim
               Eu me sento e sinto
               Lágrimas surgindo

Nem tudo tem preço
Cantem eu lhes peço
Só consigo ouvir
A chuva cair
               Eu me sento e sinto
               Lágrimas surgindo

O dia acabando
Crianças brincando
Como eu, nessa idade
Acham ovidade
               Eu me sento e sinto
               Lágrimas surgindo

Um-uumm-uumm-um...



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# Poema constante de "Girândola" (Substânsia, 2015)

│O Poeta de Meia-Tigela


O Poeta de Meia-Tigela (Alves de Aquino), natural de Fortaleza-CE, 1974, participou em 2007, da Antologia Massanova – Poesia Contemporânea Brasileira. É autor de: Memorial Bárbara de Alencar & Outros Poemas (2008); Concerto Nº 1nico em Mim Maior Para Palavra e Orquestra. Poema: Combinação de Realidades Puramente Imaginárias [Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2010]; Miravilha – Liriai O Campo dos Olhos [Confraria do Vento, 2015]. Seu blog: http://opoetademeiatigela.blogspot.com.br/.

Dormir

Estou adormecido
em sonhos recorrentes: o medo
eleva meu corpo sobre o telhado
                               e o sentimento
                               da irrealidade
                               suspende a ideia
                               de estar avivado.

Sou na igualdade o trunfo
oposto no aspecto
do homem adormecido
em si mesmo.




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# Poema constante de "Iguais" (Projeto Passo Fundo, 2013 - LINK: http://goo.gl/p8360A).


# LEIA TAMBÉM:



Pedro Du Bois, poeta e contista. Passo Fundo, RS, 1947. Residente em Balneário Camboriú, SC. Vencedor do 4º Prêmio Literário Livraria Asabeça, Poesia, com o livro Os Objetos e as Coisas, editado pela Scortecci Editora, SP. Tem publicado pela Corpos Editora, Portugal, A Criação Estética; Pela Sarau das Letras, Mossoró, RN, Seres; Pelo Projeto Passo Fundo,Brevidades, Via Rápida, Iguais e Em Contos; Pela Editora Penalux, O Senhor das Estátuas. Blog [http://pedrodubois.blogspot.com.br/].

terça-feira, 26 de abril de 2016

ESTIAGEM

I

Esta pele de peixe
resseca ao sol

(quando levaram,
daqui, o mar?)



II

Mas, vejam, sob o pó
arrasta-se a respiração

No fundo do corpo
encolhe-se a umidade



III

Vive ali um oceano
vasto azul voraz

E, notem, a morte
não soube o seu nome


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│Autor: Alberto Bresciani
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FLORES PARA COIMBRA

Que mil flores desabrochem. Que mil flores
(outras nenhumas) onde amores fenecem
que mil flores floresçam onde só dores
florescem.

Que mil flores desabrochem. Que mil espadas
(outras nenhumas não)
onde mil flores com espadas são cortadas
que mil espadas floresçam em cada mão.

Que mil espadas floresçam
onde só penas são.
Antes que amores feneçam
que mil flores desabrochem. E outras nenhumas não.



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# Poema constante de “30 Anos de Poesia” (Dom Quixote, 1997)

│Autor: Manuel Alegre

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NO MERCADO DE SORRIDENTES AZÁFAMAS

Lobo do homem,
o homem, desencontro de si:
aflito; contristado e inquieto.
Lobo do homem,
o homem engenheiro do caos,
cainçada estrídula abrindo caminho.
Lobo do homem,
o homem no limbo, à margem,
velho pierrot alucinado.

Dorme, acorda, destrói.
Dorme, acorda, destrói.
Dorme, acorda, destrói.

De olhos lacrimosos,
olhos de se amar,
medos de se morrer,
fomes de se chorar,
                 o homem lobo do homem
                 vaga sobre a Terra
                 desde os tempos de antanho
                 a estes dias de nunca.

(Que faço,
armado de palavras-gérberas,
ansioso e enguiço de poemas,
entre homens lobos de homens?
─ pergunta o poeta à beira de si.

E lhe respondem com dinheiro
& dias de saldo
no mercado
de sorridentes azáfamas).


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│Autor: Webston Moura
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